2015/05/21

The Magic Whip (Blur) | Crítica Escrita por Rui Guerra Figueira

O título do novo álbum dos Blur transporta-nos para o Verão inglês mas desde a primeira audição percebemos que lá dentro vamos encontrar o Inverno do nosso descontentamento e somos logo levados rua abaixo pela "Lonesome Street" ao som de um refrão que se reconhece imediatamente como fazendo parte da matriz do ADN musical deste grupo.

Somos deixados perdidos na rua de uma grande cidade, esmagados por gigantescas torres "New World Towers" onde o único verde à nossa volta é o do reflexo da luz de néons que espreitamos através dos espelhos labirínticos que enfrentamos quando olhamos para o céu, mas o céu só o conseguimos ver afunilado pelos edifícios altos e o único vislumbre que nos é dado ver é quando ele é rasgado por um avião que o cruza.

Esta é a banda sonora de um anti-herói moderno e nisso os Blur não podiam ser mais fiéis àquilo que foram desde o início, quer seja sob a forma de crítica social ou agora, alguma maturidade mais tarde, num brilhante olhar sobre a nossa condição de animal escorraçado, a viver em pequenos apartamentos e onde o fantasma da solidão se torna ainda mais assustador por sermos tantos no meio de tantos corpos que não podemos tocar "There are to many of us", todos em busca de uma efémera eternidade. Algures, no meio desta desolação urbana, aparece o "Ice Cream Man" mas por esta altura já não podemos ser resgatados e o prometido 'Magic Whip' não passa de uma ilusão do novo que ficou velho de tanto passado perdido. Claro que um ser preso numa caixa de fósforos sonha com uma visão do espaço, e quer ser um astronauta "Thought I was a Spaceman", e olhar o mundo ao contrário, lá de cima cá para baixo, mas afinal o deserto lunar que ele encontra não passa de uma distante duna de areia num parque citadino, aqui só se pode voar na cabeça e essa está sempre a embater na realidade cinzenta do dia-a-dia.

Neste mundo as emoções são frágeis e quebradiças, "My Terracota Heart", mas é desse órgão que surgem mais uma vez frases musicais melancólicas que nos levam a memórias felizes, daquelas que temos medo de perder porque já as soubemos perdidas.

Se tivéssemos que escolher uma capital para este desolado país interior ela só poderia ser "Pyongyang" e ela é anunciada pela campainha da carrinha do homem dos gelados, aquele que já não vemos, mas que sabemos algures na cidade a vender mais doces ilusões. A paisagem da capital encontra-se marcada pelas poucas imagens bucólicas nas quais conseguimos acreditar, a imagem de cerejeiras em flor sob a ameaça de bombas nucleares. A beleza sempre em perigo e por isso mais bela. As ruas continuam desertas e os ditadores, já sabemos, não conseguem iluminar-nos porque ao contrário da luz do sol não podem renascer no outro lado do mundo, em liberdade.

A festa só poderia acabar com uma "Mirrorball" mais uma vez os espelhos quebrados dos arranha-céus agora concentrados numa ténue linha melódica oriental. Neste álbum encontramos o passado dos Blur mas acima de tudo ouvimos o futuro, um futuro que talvez não vá para além do que aqui se ouve mas que serve para demonstrar que, ao contrário do que alguns disseram, eles são bem mais do que um conjunto de miúdos da classe média alta a quererem fazer-se passar por geezers. Cresceram e agora são bem do que a soma das partes, sejam essas partes os Gorillaz, ou um dos mil e um projetos do Damon Albarn ou do Graham Coxon. Todos se ouvem aqui, se os quisermos muito encontrar, mas a música que aqui ouvimos encontra-se muito para além desse exercício de procura inútil. Para isso temos os Críticos-Shazam, paz às suas almas. 

[artigo escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico, por Rui Guerra Figueira]

Video Credits: Damon Albarn ARG on youtube.com

.:: Artigos relacionados com os Blur neste blog: 1. Amplificador '15-1ª Parte | Radio Kraak; 2INKRAAKT: A Semana em Resumo/The Week in Summary @ Kraak Facebook Page, #212; 3. Daylight Saving Time: PodKraak #45; 4. Blur-Novo Álbum: 'The Magic Whip' [para artigos mais antigos, aceder através do link definido em 4.].


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